domingo, 17 de junho de 2012

AMBIENTALISTA, QUE NÃO ACREDITA NA RIO + 20, APONTA PROBLEMAS E SOLUÇÕES PARA MARÍLIA.

Por Célia Ribeiro

Numa época em que o mundo volta seu olhar para os desafios da economia verde, um dos pilares da Rio + 20, Conferência das Nações Unidas Sobre Desenvolvimento Sustentável, que acontece no Rio de Janeiro, um ambientalista mariliense, respeitado por seus sólidos conhecimentos, mostra-se cético quanto aos resultados concretos que o evento trará à população mundial. E vai além, afirmando que os sérios problemas ambientais de Marília são, antes de mais nada, “um problema de gestão, de vontade política”.

Leme,, numa das cachoeiras quase
no quintal de casa, perto de Nóbrega.
Aos 60 anos, Antônio Luiz Carvalho Leme é conhecido pela militância ambiental, sendo o atual presidente da ONG Origem. Entretanto, o técnico formado em economia e geografia, funcionário de carreira do IBGE, com diversas especializações na área ambiental e de recursos hídricos, é um estudioso incansável, um autodidata que não se conforma em apenas expor as feridas, mas sugerir a cura para os sérios problemas ambientais da cidade.

Da memória ele saca as lembranças da infância quando a família se reunia em alegres piqueniques às margens do Rio Feio, com suas águas cristalinas e correnteza de tal sorte que, certa vez, ele se livrou por pouco de um afogamento. Filho do consagrado fotógrafo Sebastião Carvalho Leme, que registrou a foto em preto e branco desta página, Leme contrai o semblante ao comentar, com tristeza, a degradação daquele e de outros rios da região.

Marília, com mais de 220 mil habitantes, em pleno século XXI, lança o esgoto doméstico e industrial sem tratamento nos córregos que desembocam nos rios e, pior ainda, seguem para os itambés comprometendo as belezas naturais da cidade. Conforme mostra a foto aérea tirada pelo ambientalista, o esgoto sai da tubulação e cai na cascata do vale. Como a maior parte das nascentes de água secou ou está comprometida, o que parece ser água é, na verdade, esgoto em queda livre na natureza!
Sebastião Carvalho Leme registrou essa imagem da esposa, dona Dulce,
e dos filhos no Rio Feio, quando o lugar ainda era preservado.
“O problema de Marília, basicamente, é uma questão de gestão. É uma questão de vontade política para resolver os problemas que não são poucos”, afirma o ambientalista. Segundo ele, da zona rural, onde as erosões tomam conta de vastas áreas, colocando em risco até a segurança das estradas, passando pela deficiência no abastecimento de água, tratamento do esgoto e destinação do lixo, Marília tem grandes desafios que precisa encarar antes que seja tarde demais.

ABASTECIMENTO DE ÁGUA

“A questão da água, apesar de parecer mais uma questão de engenharia, é uma questão ambiental. Não temos nenhuma política, nenhuma ação, como outros municípios, de produção de água superficial”, observa o presidente da Origem, explicando que a opção pela perfuração de poços profundos e utilização de águas subterrâneas é um grave erro. Como a recomposição dos estoques dos aquíferos demora décadas, deveria haver um estoque estratégico, para ser usado no futuro.

Flagrante de desrespeito à natureza: o esgoto cai da tubulação (no alto)
direto para a cascata que teria que ser só de água.
A alternativa apontada pelo ambientalista seriam os investimentos na produção de água superficial, com medidas concretas para recomposição de matas ciliares, proteção de nascentes, criação de leis que delimitam as regiões de abastecimento etc. Essa é uma preocupação que vários municípios têm levado a sério. Cidades que tiram seu abastecimento de águas subterrâneas, como Ribeirão Preto, estão tendo problema porque muitos poços estão secando, acrescenta o técnico.
Do banheiro para a cachoeira da
Bacia do Barbosa

No caso do esgoto, Leme observa que o problema é igualmente grave porque compromete a qualidade da água captada para o abastecimento da população. Além de contaminar com dejetos os córregos e rios de Marília, o esgoto impacta nos municípios da região porque o material orgânico demora a se degradar. Além disso, tem a questão dos produtos químicos que não são eliminados. Diante disso, a conclusão das obras de canalização e tratamento de esgoto torna-se vital para a cidade.

 ATERRO SANITÁRIO

“O que me preocupa hoje é a questão do lixo. Há rumores de fazer a queima”, disse, citando a possível opção da próxima administração municipal pela instalação de usina de incineração do lixo para geração de energia. Segundo Leme, na Alemanha, que saiu na frente no uso dessa tecnologia, já estão revendo o processo diante dos riscos ambientais provocados pela emissão de gases altamente tóxicos, como o gás furano.

O ambientalista levantou ainda outra questão: para a viabilidade econômica da usina são necessárias, no mínimo, 500 toneladas de lixo por dia. Marília produz cerca de 170 toneladas por dia, sendo que 70% poderiam ser reciclados. Ou seja, não há lixo suficiente que justifique a usina de incineração.

Leme e companheiros da ONG Origem
A saída, na opinião do técnico, seria Marília investir na coleta seletiva de lixo, na instalação de uma usina de reciclagem, gerando emprego e renda, e construir um aterro sanitário adequado para os 30% de material orgânico que não tem como reciclar.

Finalizando, Leme defende uma vigilância maior da população cobrando a aplicabilidade de leis que foram criadas, há muitos anos, e não saíram do papel. Ele citou “a função do fiscal ambiental, que seria exercida sem remuneração, com treinamento da sociedade; a lei do impacto da vizinhança tem 08 anos e o Fundo Especial do meio Ambiente foi criado em 2004”. Nada disso foi colocado em prática.

RIO + 20

Sobre a Conferência das Nações Unidas Sobre o Desenvolvimento Sustentável, Leme mostrou-se cético quanto aos resultados concretos. Afirmou que a questão não é o desenvolvimento, já que o planeta não tem matéria prima nem recursos naturais para suportar o crescimento que se pretende, mas sim a melhor distribuição do consumo. “Para ter um desenvolvimento nos moldes dos Estados Unidos, por exemplo, precisaríamos de 03 planetas. Isso é loucura”, ponderou.
Foto aérea mostra erosão na zona rural
No entanto, o presidente da ONG Origem observou que a Cúpula dos Povos, evento paralelo à Rio + 20, que reúne pessoas de dezenas de países compartilhando suas experiências, é bastante válida. A troca de informações entre cidadãos do mundo todo poderá, ao menos, levar luz e talvez produzir boas experiências que poderão ser replicadas, concluiu.

Obs: Fotos do arquivo pessoal de Antônio Luiz Carvalho Leme

 * Reportagem publicada na edição de 17.06.2012 do Correio Mariliense

Um comentário:

  1. Concordo com todas as letras que a questão ambiental em Marília sem duvida é um problema de gestão política, não a interesse.
    E conforme as conversas que se houve com relação a próxima eleição em Outubro para a Prefeitura de Marília será difícil a mudança mas como cidadão e morador da cidade não podemos deixar de ter "Esperanças". Tem que se haver uma mudança de cultura, como já é sabido os recursos naturais não são para sempre, um dia vai acabar.
    Temos que pensar também na PNRS - Política Nacional de Resíduos Sólidos onde todos como órgãos públicos e privados tem que se adequar até Dezembro de 2013 onde a partir de Janeiro de 2014 as notificações, multas entram em vigor.

    Sandro Ap. Medeiros

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