terça-feira, 17 de agosto de 2010

A Favela experimenta um novo olhar. Colorido de esperança.

Por Célia Ribeiro

O que prostitutas, travestis e garotos de programa poderiam ensinar a estudantes universitários, numa populosa favela da zona sul de Marília? Não há uma única resposta, mas várias, que vêm sendo dadas, desde a fecundação do embrião que se tornou a Organização Não Governamental (ONG) “Psicologia Social”, há quatro anos.


Cores que transformam

Tudo começou com um trabalho de monografia elaborado pelo então estudante do 4º ano do Curso de Psicologia da Unimar, Rodrigo César Vieira. “A idéia era aproximar a psicologia dos profissionais do sexo porque, embora não seja como 20 anos atrás, a psicologia ainda é muito elitizada”, contou o psicólogo e coordenador da ONG.

Do trabalho de campo, realizado nas conhecidas ruas do centro da cidade e nos postos de combustível às margens das rodovias, a pesquisa chegou à Favela do bairro Tóffoli e agora os voluntários (profissionais de várias áreas) liderados pelo psicólogo, atendem cerca de 80 das 250 famílias do local.

Enxugando gelo


Rodrigo, coordenador

“Quando você vê um escravo apanhando, existem três maneiras de ajudá-lo. A primeira é comprar o escravo e cuidar de cada uma de suas feridas; a segunda maneira é vê-lo apanhando, se sensibilizar, juntar dinheiro e comprá-lo; a terceira opção é realizar um trabalho de articulação política e conseguir uma lei que liberte não só aquele escravo, mas todos os outros”, afirmou o psicólogo.

Com essa metáfora, Rodrigo Vieira explicou que surgiu a idéia da ONG que além dos profissionais voluntários, recebe apoio de igrejas evangélicas, da Unimar, da Cáritas Diocesana, da Casa do Pequeno Cidadão (Unidade III), da Secretaria Municipal da Juventude e militantes do movimento Hip Hop.

Além da pesquisa acadêmica, são realizados atendimentos individuais e em grupo de prostitutas, travestis e garotos de programa, além de suas famílias (principalmente crianças e idosos). Paralelo aos atendimentos, a ONG procura focar na adolescência num trabalho preventivo que quebre o círculo vicioso que leva à prostituição e às drogas. Aos 31 anos, Rodrigo destaca o apoio da esposa, Gisele, voluntária nas atividades com as crianças.

Sede no barraco

Massas geram renda


Destoando das moradias precárias da favela do Tóffoli, o barraco que funciona como sede da ONG é todo colorido. “Existe um mercado imobiliário lá. No começo, pagávamos 60 reais de aluguel”, conta o coordenador que anuncia a expansão do projeto para a favela da Vila Barros, onde moram 600 famílias, aproximadamente.

“Tentamos plantar sementes de consciência. Cada um faz o que quer”, observa Rodrigo ao contar a história de uma adolescente, de 16 anos, que se prostituía desde os 12 anos: “Normalmente, eles usam muita droga para encarar a noite. Essa garota teve um ‘insight’ quando percebeu que sua irmã caçula, de quem gostava muito, estava indo pelo mesmo caminho das drogas e prostituição”.

Segundo ele, a jovem “teve uma conversa com a irmãzinha e, neste momento, conseguiu forças para sair”. Um dos aprendizados, lembra Rodrigo, foi quando a moça disse que não se considerava vítima da sociedade porque poderia ter sido levada àquela situação, mas permanecer nela era sua opção. “Se a pessoa estiver culpando muito a sociedade,culpando muito os outros, vai ter dificuldade para sair”, pontuou.

O trabalho com as crianças e adolescentes está merecendo atenção especial da ONG. Rodrigo contou, com tristeza, que uma menina que se droga e se prostitui, aos 13 anos, chegou a passar pelo projeto quando tinha 9 anos: “É como óleo que vaza entre os dedos. Infelizmente, não conseguimos segurar”, lamentou para, em seguida, assegurar que o público infanto-juvenil é uma das prioridades agora.

Adolescentes, público alvo


Neste sentido,o psicólogo lamentou a falta de instituições locais para recuperação de usuários de álcool e drogas voltadas, principalmente, às meninas.

Geração de renda

“Trabalhar o emocional sem pensar no social é como o avião de uma asa só”. Assim, o coordenador da ONG anunciou uma nova etapa, a geração de renda. Estão começando os trabalhos para produção de sacolas retornáveis (eco bag) com apoio de uma empresária da Grande São Paulo.

Essa é daquelas notícias que tingem de esperança o futuro das comunidades assistidas pela ONG. Colorido como a sede na favela.

Favela, vista por dentro.


Reportagem veiculada na edição de 30/05/2010 do Correio Mariliense.

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